sexta-feira, junho 30, 2006

Retórica (ρήτωρ)


A retórica, uma das liberal arts, é a arte da persuasão. Conhecer um pouco dela é fundamental para aproveitarmos o máximo dos debates dos quais participamos. Serve também como antídoto para a vaidade, que está sempre à espreita das rodas de discussão, desde simpósios até papos-furados de boteco. Conhecendo as técnicas de persuasão, você pode relaxar e utilizar o debate a seu favor, sem se importar em ganhar ou perder. Os focos passam a ser o aprimoramento de suas idéias e o teste de suas convicções.

Uma técnica muito usada, principalmente por aqueles que possuem conhecimentos em matérias variadas, é a "metralhadora de argumentos". Podem ser dados, números, conceitos, exemplos ou citações. Em casos extremos, vem tudo junto. Acho que a melhor defesa contra esta técnica é utilizar a matemática. Sim, uma equação matemática. Coloque a tese que está em debate em evidência, e o restante entre parêntesis. O ideal é ouvir pacientemente toda a argumentação, aprender o que interessar, e deixar para reorganizar a discussão no final. Agradecendo pelas novidades entre parêntesis, verifique se, afinal, a tese foi ou não refutada. Se não foi, apresente a tese novamente, se foi melhor ainda: mais um aprendizado. E dê-lhe dialética.

Outra técnica é o "emputecimento repentino". O sujeito encerra o assunto fazendo uma declaração, seguida de um palavrão ou grunhido. Muitas vezes retira-se da roda nesse momento para ir ao banheiro. O contra-golpe raramente vale a pena.

Uma das mais usadas é o "recrutamento". Você está quieto desde o início do papo, que está polarizado entre duas outras pessoas. Rapidamente uma delas olha para você, dizendo:
- Como você mesmo disse blá, blá, blá...
O cara quer te colocar do "lado" dele, o que às vezes está bem, às vezes não está.

Os recursos e alegorias da retórica são inúmeros, e observá-los durante um debate é um entretenimento à parte. Falando em diversão, vá ao American Rhetoric, um site com conceitos sobre retórica e discursos memoráveis.

terça-feira, junho 27, 2006

Novas luzes e sombras


Eugène Delacroix (França, 1798-1863) é considerado um dos mais influentes pintores românticos. Os românticos nasceram com os ideais iluministas, valorizando a individualidade, quebrando certas regras clássicas, inclusive de comportamento. A inovadora forma de utilizar as cores destes pintores inspirou os impressionistas, para nosso deleite. “Hamlet e Horácio no Cemitério” está no Louvre, em Paris.

quarta-feira, junho 21, 2006

Ainda somos bárbaros

No capítulo XVII de “O príncipe”, no qual Nicolau Maquiavel (Itália, 1469-1527) analisa se é melhor, para o governante, ser amado que temido ou o inverso, encontra-se uma minuciosa descrição da condição humana: “...geralmente se pode afirmar o seguinte acerca dos homens: que são ingratos, volúveis, simulados e dissimulados, fogem dos perigos, são ávidos de ganhar... têm menos receio de ofender a quem se faz amar do que a outro que se faça temer... esquecem mais rapidamente a morte do pai do que a perda do patrimônio”. A conclusão do famoso capítulo é que, diante de homens nestas condições, é melhor para o príncipe ser temido que amado.

Se Maquiavel, por um lado, dava lições de tirania aos príncipes, por outro ensinava liberdade aos povos. Enquanto enxergarmos o mundo através de sombras, acorrentados à nossa condição bárbara, veremos nossas democracias se degenerarem em populismos, e depois sucumbirem em tiranias. Aquele que exercita a virtude é mais livre, porque combate a retórica fascista e não permite que um tirano tente justificar sua presença.

segunda-feira, junho 19, 2006

Figuras de Linguagem

A utilização indevida de figuras de linguagem me preocupa, sobretudo porque corrompe o debate. Hipérboles engendram estereótipos, eufemismos comprometem convicções e ironias são as máscaras preferidas dos cínicos. Muitas vozes contemporâneas importantes perdem espaço por causa de exageros desnecessários, e são jogadas no limbo como reacionárias. Por outro lado, viver buscando uma terceira via para qualquer coisa, da arte à política, é um emblemático sinal de covardia. Mas o pior é o descontrole da ironia. Trata-se de um subterfúgio de dificílimo domínio, que vicia e nutre a campanha sofista vigente. Prefiro fazer uma reverência a Machado de Assis e concentrar esforços no debate sincero, ainda que às vezes seja necessário me submeter ao rigor do método.

domingo, junho 11, 2006

A Cidade

Para Marila. Primeira parte.

A cidade se move conforme os anseios do homem, "animal cívico". As novas formas de morar, tanto as encasteladas nos condomínios e shoppings, quanto as invadidas nas favelas e camelôs, são conseqüências da injustiça e da violência do homem. Nós somos injustos, e nossos vícios estão espelhados nas cidades. Neste sentido, as soluções em busca da justiça devem estar apoiadas na liberdade do indivíduo para desenvolver plenamente suas virtudes, sem precisar projetar sua responsabilidade no poder público. A cidade justa não será fruto das leis de uso do solo nem do estatuto das cidades, mas do trabalho e da moral de cada cidadão que ajudará a construí-la.

terça-feira, junho 06, 2006

A Morte de Sócrates


Jacques-Louis David (França, 1748-1825), ícone da pintura neoclássica, esteve à serviço de Robespierre e de Napoleão Bonaparte, mostrando que a arte está acima das idéias. Similar na técnica aos renascentistas, o artista neoclássico difere na adoção de temas: mais épicos e menos religiosos. De 1787, "A Morte de Sócrates" retrata o filósofo teorizando sobre a imortalidade da alma, justificando sua escolha pela sentença de morte, ao invés da renúncia de suas teses, mostrando que as idéias estão acima das paixões humanas. Está no Metropolitan, NYC.

domingo, junho 04, 2006

A terceira via da arte

A terceira via da história da arte é o Realismo. Enquanto os neoclássicos pintavam o belo, os românticos olhavam para o sublime. Embriagando-se em prostíbulos revolucionários, o Romantismo dissolvia a perfeição dos contornos neoclássicos. Essa era uma guerra cultural marcante, e sua relevância era nada menos que a busca da verdade: de fora para dentro ou de dentro para fora. O Realismo, deslocado do percuciente debate filosófico, resolveu pintar o objeto exatamente como ele era, eliminando o espírito criativo do artista. Ora, para pintar algo verossímil, melhor observar o objeto diretamente. Ou contratar um retratista.

sexta-feira, junho 02, 2006

Parla!

Moisés, de Michelangelo Buonarroti (Itália, 1475-1564), obra-prima da escultura renascentista, localizada na Paróquia de San Pietro in Vincoli, Roma. O artista registra a ira de Moisés que, recém descido do monte Sinai, observa com ar de reprovação seu povo adorando um bezerro de ouro. Em seguida Moisés quebra as tábuas da lei que carregava, destrói o bezerro de ouro e ora. Deus reescreve as palavras em duas novas tábuas de pedra.

quinta-feira, junho 01, 2006

Quid est Veritas?

Em sua primeira epístola aos Coríntios, o Apóstolo Paulo explica que a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus (3,19). Corinto era uma importante cidade grega em 50 d.C., poucos séculos depois de Platão e Aristóteles lançarem o facho de luz que pavimentou a linha da história ocidental. Estaria o Apóstolo sepultando a possibilidade de o homem chegar à verdade definitiva através do exercício de sua razão? Pôncio Pilatos já havia amaldiçoado a indagação ontológica “o que é a verdade?”, provavelmente enquanto observava suas próprias mãos. Hoje nos restam o advento do niilismo e a massificação da ignorância. Mesmo que o mistério não se converta em um enigma, caminhar em sua direção será eternamente o mais violento fluxo no sentido do bom, do belo e da virtude humana.

Arte e Filosofia

Meu pai é a filosofia, minha mãe é a arte. Meu pai é filósofo não somente pelos pensadores que conhece, pelos livros que leu, mas porque toma partido pela filosofia que acontece, em sua vida, na realidade. Mais do que dizer o que pensa, vive o que pensa, e educa através de sua biografia. Minha mãe é arte que acontece. Há tempo para ser acadêmica, e tempo para ser abstrata. E a transição entre estas duas formas é a transformação que ocorre em sua própria vida.

Arte, filosofia e algumas de suas conseqüências. A isto eu gostaria de dedicar meu tempo, aqui.